13 agosto 2024

PASSEIO DOS POETAS - PRAIA DE SANTA CRUZ

 

PASSEIO DOS POETAS

Joaquim Moedas Duarte


Grupo dos passeantes

Integrado no projecto PASSOS EM VOLTA, realizou-se no dia 10 de Julho de 2024, o Passeio dos Poetas, na praia de Santa Cruz, guiado por Joaquim Moedas Duarte, membro da Direcção da Associação do Património (ADDPCTV) de Torres Vedras.

Recordo que estes passeios são organizados pelo sector de Turismo da Câmara Municipal de Torres Vedras, sendo sua responsável a Ângela Vitória (na foto, vestida de aul com uma folha de papel nas mãos).
A Associação de Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras (ADDPCTV) é parceira em muitos destes passeios, como foi o caso de hoje.

Este trajcto, na zona central de Santa Cruz, é uma evocação de três poetas que, em diferentes épocas, aqui passaram férias: Antero de Quental, João de Barros e Kazuo Dan. A sua presença é perpetuada por três monumentos alusivos.
A parte final da actividade foi feita na Capela de Santa Helena, com a actuação de Weber Carvalho, (na foto com o violão e os seus dois meninos). O Weber está em Portugal (reside em Santa Cruz, com a sua mulher) há cerca de dois anos, a fazer um Mestrado na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Contactou-me no ano passado, para saber mais coisas sobre Antero de Quental, cuja estátua sentada o motivou a aprofundar conhecimentos. Tornámo-nos amigos.
O Weber tem múltiplos talentos: além de professor, dinamizador cultural (animação de grupos, teatro, manufacturas,,,), é cantor. Musicou cinco sonetos de Antero de Quental e cantou / encantou os 22 participantes no passeio de hoje.
Estou-lhe muito grato assim como aos participantes, pela sua interessada e atenta presença.
Para mim, foi uma alegria sentar-me mais uma vez ao lado do Antero de Quental, depois de falar tão bem dele.
Até ao próximo "Passos em Volta"!

IGREJA DE S. DOMINGOS DE CARMÕES - VI FESTIVAL DE MÚSICA ANTIGA DE TORRES VEDRAS / Jornal BADALADAS 26 JULHO 2024

  

IGREJA DE S. DOMINGOS DE CARMÕES

VI FESTIVAL DE MÚSICA ANTIGA DE TORRES VEDRAS

 

Joaquim Moedas Duarte

(Texto e fotos)

 

Entre 18 de Maio e 29 de Junho deste ano, decorreu o VI Festival de Música Antiga de Torres Vedras, organização da Câmara Municipal de Torres Vedras. Foi seu curador Daniel Oliveira, Professor de Órgão na empresa Escola Artística de Música do Conservatório Nacional. O conceito que inspirou os cinco concertos está expresso no texto de apresentação pública: “Criando pontes entre o passado e o presente, o Festival de Música Antiga de Torres Vedras convida-nos, a todos, a uma autêntica viagem pelo património histórico de Torres Vedras”.
A Associação do Património de Torres Vedras (ADDPCTV), através de Joaquim Moedas Duarte, membro da Direcção daquela associação, foi parceira, fazendo em cada concerto a contextualização patrimonial do espaço em que ele decorria. Em 16 de Junho, foi na Igreja de S. Domingos de Carmões.

 

A IGREJA




Em 1758, o Padre Baltazar Freyre da Costa, pároco de S. Domingos de Carmões, respondeu ao inquérito que foi mandado fazer pelo Marquês de Pombal sobre os estragos feitos na sua paróquia pelo terramoto de 1755.

A igreja de que ele fala é bem diferente desta em que hoje estamos. Ficou bastante arruinada e as obras de arranjo demoraram porque, diz ele: esta freguesia é pequena e pobre, os habitantes todos tiveram destruição nas suas casas, que para nelas habitarem repararam como puderam o mais necessário, e no tempo presente estão mais necessitados pela falta e careza do pão, por cuja causa estão mais aptos para pedirem esmolas do que para poderem fazer a sua Paróquia”.

Mais adiante, informa que na igreja caíram dois pedaços da abóbada, um sobre o coro que abateu, e outro junto ao arco do cruzeiro. Toda a abóbada ficou fendida pelo meio, o arco desuniu-se, as paredes com fendas, assim como a tribuna da capela mor, “que é de pedraria com quatro colunas manchadas de branco e vermelho. A torre do sino ficou com muitas aberturas e fendas,, mas não caiu talvez por estar presa  na parte superior com linhas de ferro”.

Lembremos:

Carmões é lugar antigo, já referido documentalmente no início do séc. XIV. Devido ao crescimento do número de moradores, aqui se fez uma ermida em 1507, para assistência religiosa aos moradores, e logo depois se constituiu a paróquia, subordinada à Igreja de S. Pedro, de Torres Vedras.

Esta é uma zona onde se estabeleceram grandes quintas, sinal de prosperidade agrícola em que pontificavam famílias abastadas. Em época de grande religiosidade, dever-se-á a estas famílias a substituição da ermida primitiva por um templo maior, onde se instituíram capelas de devoção e sufrágio fúnebre, jazigos para inumação de defuntos ilustres. É isso mesmo que vemos nas lápides de dois altares laterais: do lado da Epístola, a capela instituída em 1630 por Francisco Mendo Trigoso, da família que foi proprietária da Quinta do Belo Jardim, aqui em Carmões e que mais tarde se ligaria com a família Aragão, da Quinta Nova, em Matacães. Esta capela foi reformada mais tarde, como se pode ver nas diversas inscrições, nas quais surge a data de 1775.

Do lado do Evangelho, temos a capela instituída pelo Padre Iº [Inácio? Ierónimo?] da Costa Queirós, em 1639, de uma família que terá sido de boa abastança.

Há também referências a um ramo da família Botto Pimentel, que tem jazigo mais recente no cemitério de Carmões, e de que se conhecem inumações nesta igreja.

Esta enumeração pode explicar a riqueza decorativa do templo em que estamos.




Desde logo a profusão de mármores em todos os retábulos, conferindo unidade de conjunto. O da Capela Mor, com colunas de mármore rosa e veios brancos, e capitéis compósitos. Nos outros altares, há mármores de diversas cores. Nota especial para as mesas de altar, em bloco maciço de mármore amarelo. Nas paredes laterais da Capela Mor, os mármores são substituídos por belíssimos estuques marmoreados.

Para não nos alongarmos, referimos resumidamente o que merecerá um olhar mais demorado:

O Trono do Santíssimo, no retábulo da capela-mor; colunas do coro alto, com belos capitéis e altos socos; capela batismal; silhar de azulejos do final do Séc. XVIII (D. Maria).

No altar da capela do P. Queirós, uma tábua do Séc. XVII, representando “A Virgem com o Menino intercedendo pelas Almas”.

Belíssimo lavabo da sacristia, datado de 1772.



 

PRESERVAÇÃO

Mas o tempo não parou na época dos antepassados que nos legaram este magnífico templo.

Os anos gastaram, e até arruinaram, o que eles fizeram. Só a persistência e o amor pelo Património, que são timbre da comunidade de Carmões, explicam que possamos admirar este espaço como se ele tivesse sido acabado de construir.

Referência justa à comunidade religiosa e ao empenho de pessoas como Georges Steyt e Altino Cunha, Padre Diamantino Teixeira, Pároco de S. Domingos de Carmões entre 2015 e 2021. De salientar, também, o apoio constante da Câmara Municipal de Torres Vedras.

Como se sentiria feliz, o Padre Baltazar, se aqui estivesse hoje. Ficaria como nós, fascinado por este magnífico espaço, onde iremos ouvir a música que foi criada no tempo em que esta igreja foi restaurada, depois do terramoto, o magnificente e festivo Séc. XVIII.

 

         


    

 

 

      

 

 

       

 

 

 

 

  

 

 

 

 

 

Um outro japonês em Santa Cruz - Memória de um drama / Jornal BADALADAS - 28 JUNHO 2024

 

Um outro japonês em Santa Cruz

Memória de um drama

Manuela Catarino

“A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar identidade, individual ou colectiva, cuja busca é uma das actividades fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje” escreveu o historiador Jacques Le Goff, sublinhando que a “memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura salvar o passado para servir o presente e o futuro.”1

 

I – 2024, Santa Cruz

Numa tarde de conversa, a propósito de factos relacionados com os quotidianos e a história da praia de Santa Cruz, relembrava-se a figura do escritor japonês Kazuo Dan, que escolheu ali viver nos anos 70 do século passado. A certa altura, um dos interlocutores acabou por referir uma antiga memória, transmitida pelo pai e pelo avô, sobre um outro nipónico que teria tido naquelas águas um fim trágico. Ignorava o nome e as razões da sua vinda, mas uma certeza tinha: havia acontecido em Santa Cruz.

A inicial surpresa deu lugar à necessidade de saber algo mais. Fomos em busca dos factos, esperando que as fontes documentais nos elucidassem. Queríamos recuperar aquela memória.

II – 1910, Miss Phoebe Roberts, Campeã mundial de luta Ju-Jitsu, em Portugal

A presença de Phoebe Roberts, em Portugal, mereceu honras de destaque na revista Ilustração Portugueza de Janeiro de 1910. Uma novidade e um assombro assim se lhe referia o articulista, contrapondo o seu aspecto franzino, longa trança loura e olhos azuis (denotando a sua ascendência britânica) ao das mulheres de forças que habitualmente se apresentavam nos circos.2


Phoebe Roberts e Yuzo Hirano segundo a Illustração Portugesa

 

Nascida em 1887, em Londres, começou aos quinze anos a tomar as primeiras lições de Ju-Jitsu na Japanese School of Jujitsu, em Oxford Street, onde, em breve, pelas suas capacidades excepcionais se tornou instrutora e atleta. A escola tinha então mestres de nomeada –  de entre os quais Yukio Tani, Taro Miyake, e Yuzo Hirano. A carreira de Phoebe foi ganhando o maior destaque na Inglaterra. Em 1907, mestre Hirano e Phoebe casaram, partilhando ambos não apenas o gosto pela prática do ensino como o da divulgação do Ju-Jitsu pela Europa. Numa dessas visitas chegaram a Portugal, suscitando a admiração do público. As apresentações foram um êxito como noticiado na Illustração Portugueza. O casal prosseguiu a sua actividade em outros palcos europeus e, em 1915, Hirano voltaria a Portugal.

III– 1915, O Circo Royal em Torres Vedras

Em Março de 1915, na sala do Coliseu dos Recreios, em Lisboa, o Cirque Royal de Bruxellas apresentara, para além da sua companhia equestre, e de outros interessantes artistas, a estreia de “L’homme sans peur” protagonizado pelos equilibristas “Beby and Glads”, com estrondoso sucesso.


O Circo Royal na sua digressão por Portugal 3 – Feira de Santiago, Setúbal (1915).


Em 30 de Setembro desse ano, noticiava o jornal A Vinha de Torres Vedras que se havia instalado, na porta da Várzea, a companhia do Circo Royal, de Bruxelas, e que as três sessões apresentadas tinham tido um agrado muito grande do público. Informava, ainda, que se faria um espectáculo de gala “com a despedida da família Villani” e no sábado seguinte actuaria o aclamado “clown Beby Frediani”, com a apresentação de novos artistas e grande campeonato de luta greco-romana.

Era acontecimento para atrair gentes da vila e dos arredores. A fama do Circo Royal chegava de várias partes do país, e do mundo, onde se apresentara com o maior sucesso:  entre várias piruetas e destrezas, o arriscado número da família Frediani com a coluna de três acrobatas sobre o dorso de um cavalo a galope, fascinava e atemorizava plateias. Dois irmãos, Willy e Aristodemo (Beby) completavam, em altura, a acrobática coluna com Zizine, filho do primeiro.

Beby sofreu várias quedas que o incapacitariam cada vez mais para as acrobacias equestres, o que veio a acontecer em 1918. Todavia, a sua natureza de comediante, proporcionou-lhe a criação de uma figura muito especial –  a do “clown” desajeitado e manhoso que desencadeava o riso. Perdia-se o acrobata, nascia o palhaço.

 

IV- 1915, Outubro, praia de Santa Cruz

Na edição de 7 de Outubro de A Vinha de Torres Vedras lia-se em notícia de primeira página: “Na segunda feira foram passear á praia de Santa Cruz os artistas Beby Frediani e sua esposa Gladis Frediani, que aqui teem trabalhado nesta vila, no Circo Royal. Acompanhava-os o professor Kirano, que viera de Lisboa para lutar com Beby no domingo e estando annunciada nova luta para aquele dia em que se deu o trágico sucesso que vamos narrar.”

O drama acontecera à frente de todos: vestidos os fatos de banho, os três amigos foram, contudo, “advertidos pelo banheiro José do Pisão” da perigosidade do mar. “Kirano, confiando nas suas forças, entrou na agua e nadando, rompeu tres ondas, mas, no mesmo instante virou-se para terra, parecendo aflito, a pedir socorro. Mrs. Gladis, com uma intrepidez notável, atirou-se á agua em auxilio do lutador japonez, mas, chegada junto a Kirano, foi por este agarrada por um pé, e no meio das suas aflições, fez esforços supremos para se livrar. Uma onda arremessou Kirano sobre uns penedos, fazendo-o desaparecer e atirando mrs. Gladis para a praia, onde a meio caminho se agarrou ao salva – vidas, sendo recolhida já sem forças.”

A senhora Gladis foi prontamente assistida pelo médico Francisco Esteves de Oliveira, que se encontrava na praia. O corpo de mestre Yuzo Hirano nunca mais apareceu. A sua viúva Phoebe voltaria a casar, em 1916 com D. Carlos de Castro Henriques. Falecida em Outubro de 1936, foi sepultada no cemitério do Prado do Repouso, na cidade do Porto.

Esta tragédia seria recordada, em Agosto de 1931, nas páginas de O Jornal de Torres Vedras a propósito de uma ocorrência com uns jovens banhistas da Merceana, que se atreveram a desafiar imprudentemente as ondas. Também nesse drama de nada valeram os esforços do então banheiro Joaquim da Perpétua. Da memória dos habitantes fazia eco o jornal: “É certo que, felizmente, depois da morte do celebre nadador japonês, Kirãno(?) e isto ha jà uns quinze anos, não nos ocorre que alguém mais, pereceu nas aguas de Santa Cruz”.


V – 2024, Santa Cruz

Passou mais de um século do infausto acontecimento que ceifou a vida ao mestre de Ju-Jitsu, Yazu Hirano no mar de Santa Cruz. Das gerações que, entre si, foram transmitindo oralmente o sucedido, possivelmente muito poucos estarão vivos para o relembrar. Restam as fontes documentais, acervos da memória, para nelas recolher e tentar reconstituir os acontecimentos. Nesta partilha que fazemos procurámos resgatar do esquecimento não apenas a figura de um individuo, mas também evocar mais um elo de ligação entre as vivências de uma comunidade.

 

NOTAS:

1-      Jacques Le Goff, “Memória”In Enciclopédia Einaudi, Volume I Memória-História, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1984, pp.46-47.

2-      Illustração Portugueza, Nº 204, Lisboa, 17 de Janeiro de 1910, pp. 86-87.

3-      Imagem reproduzida de José Manuel Madureira Lopes e Alberto Manuel de Sousa Pereira, A indústria das conservas de peixe em Setúbal, Estuário, 2015.

4-      “ 1910 – A primeira Senhora praticante de Ju-Jutsu em Portugal: Phoebe Laugthon ou Miss Roberts Phoebe” in

  http://clubejudoporto.weebly.com/histoacuteria--histoacuterias/-1910-a-primeira-senhora-praticante-de-ju-jutsu-em-portugal-phoebe-laughton-parry-de-castro-henriques

5-      Miss Phoebe Roberts, “Champion Lady Ju-Jitsu Wrestler of the World” in

https://bartitsusociety.com/miss-phoebe-roberts-champion-lady-ju-jitsu-wrestler-of-the-world/

6-     Dominique Denis, “ Augusto Frediani, fondateur de la célébre lignée” In https://www.circus-parade.com/2021/03/06/augusto-frediani-fondateur-de-la-celebre-lignee/

7-     “ Aristodemo Frediani dit Beby ( 1885-1958) in

https://www.cirk75gmkg.com/article-aristodemo-frediani-dit-beby-1885-1958-103460537.html

8-      O Thalassa, Anno III, nº92, Lisboa, 19 de Março de 1915.

9-      A Vinha de Torres Vedras, XXI Ano, Nº 1:130, 30 de Setembro de 1915.

10-   A Vinha de Torres Vedras, XXI Ano, Nº 1:131, 7 de Outubro de 1915.

11-   O Jornal de Torres Vedras, Ano III, Nº109, 2 de Agosto de 1931.

 


 

12 agosto 2024

MARIA LUCÍLIA MIRANDA SANTOS - UMA JUSTA HOMENAGEM / Jornal BADALADAS, 31 MAIO 2024

 

Maria Lucília Miranda Santos

UMA JUSTA HOMENAGEM

José Eduardo Miranda Santos Sapateiro

 


Maria Lucília Miranda Santos, destemida opositora do regime salazarista, foi a advogada que mais presos políticos defendeu durante o Estado Novo, trabalho que fazia gratuitamente. Foi agora homenageada, a título póstumo, pela Ordem dos Advogados Portugueses. Recebeu a distinção seu filho, José Eduardo Sapateiro, juíz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça. A Associação do Património de Torres Vedras (ADDPCTV) associa-se a esta homenagem, recordando que a Drª Mª Lucília foi dedicada associada e seu filho, autor deste texto, faz parte dos actuais Corpos Sociais desta Associação. Mª Lucília, nascida em 1922, deixou-nos em 15 de Novembro de 2016.| JMD

 

«O Conselho Geral da Ordem dos Advogados Portugueses, deliberou em sessão de 2 de fevereiro de 2024, conceder, a título póstumo, a Medalha de Ouro da Ordem dos Advogados Portugueses à Dra. MARIA LUCÍLIA MIRANDA SANTOS pelo seu elevado mérito e relevante ação na defesa dos direitos, liberdades e garantias dos/as cidadãos/ãs, com plena identificação com os ideais de justiça, liberdade e defesa do Estado de Direito que norteiam a ação desta Ordem.

Por ocasião do 50.º aniversário do 25 de abril, a Ordem dos Advogados homenageia a Advogada e reconhece o seu exemplo no exercício de uma  Advocacia livre, independente e combativa pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e pela oposição ao regime fascista e defesa do Estado de Direito Democrático».

       

É esta Declaração, datada de 23 de abril de 2024 e assinada pela Bastonária da Ordem dos Advogados, Dra. Fernanda de Almeida Pinheiro, que se pode ler, por debaixo da Medalha de Ouro atribuída, por tal organismo representativo dos advogados, a minha mãe.     

Minha mãe, como nome profissional, usava apenas o de MARIA LUCÍLIA MIRANDA SANTOS.  Se bem que, de seu nome completo, se chamasse DA LIBERDADE. Por força da sua tia e madrinha AURORA DA LIBERDADE.  Fez, de muitas formas, jus a esse apelido privado e escondido.

Se ainda hoje fosse viva, teria 100 anos de idade. E certamente ficaria tão ou mais orgulhosa, honrada e emocionada quanto a sua família, com a justa homenagem que lhe foi feita, nesse dia 23 de abril de 2024, no Salão Nobre dessa Casa Ilustre dos Advogados.

Minha mãe era, antes de mais, de corpo e alma, UMA ADVOGADA. Adorava a sua profissão, principalmente quando esta a levava à barra dos tribunais por esse país fora. Com o seu sentido de humor muito próprio, dizia que era a defensora dos «frascos e dos comprimidos» (fracos e oprimidos), como foi o caso, já depois do 25 de abril, de muitos rendeiros rurais que patrocinou e que se juntavam, aos magotes, no seu escritório, em Torres Vedras, onde desenvolveu a sua atividade durante várias décadas. 

Para vencer no meio masculino dos advogados, viu-se compelida, no gabinete do juiz, onde todos se encontravam, a dar um par sonoro de bofetadas no rosto de um varão e barão da advocacia de uma comarca de província de então, quando este, arrogante e superior, a mandou cozer meias para casa em vez de estar no tribunal a exercer essa nobre e incontornável profissão. O som das mesmas fizeram eco imediato no meio social envolvente, que funcionando como uma enorme caixa de ressonância, foi transportando adiante a história daqueles sopapos, por muitos anos. Estando longe de ser um caso único, a resistência também se fazia por aí, nessa época.

Foi a partir de 1958, com as eleições para a Presidência da República, em que concorreu o General Humberto Delgado, que começou a ter intervenção política, enquanto cidadã e advogada, na sociedade portuguesa de então, participação essa que, de maneira mais ou menos ininterrupta, se prolongou até depois do 25 de abril de 1974, sendo de realçar os muitos julgamentos que efetuou, enquanto defensora de presos políticos e a sua pertença à COMISSÃO NACIONAL DE SOCORRO AOS PRESOS POLÍTICOS, tendo muitas das suas reuniões se realizado no seu escritório em Lisboa.

Apesar de essa sua atividade política de protesto e combate ao Estado Novo, nunca esteve presa,  nunca pertenceu a nenhum partido  [embora tivesse apoiado, pelo menos em 1969, a CDE (COMISSÃO DEMOCRÁTICA ELEITORAL)] nem nunca foi comunista. À imagem, aliás, de muitos outros opositores ao regime fascista, que também resistiram fora das fileiras ou da influência do Partido Comunista Português. Tal não significou qualquer animosidade contra o PCP, tendo ela perfeito conhecimento da importância e papel desse Partido na resistência ao fascismo, assim como dos muitos sacrifícios feitos pelos seus militantes nessa luta de décadas  contra o regime.  

 

CORAGEM

Era uma mulher corajosa, temerária, roçando, por vezes a imprudência.

Recordo um episódio que ela me contou e que terá decorrido no ano de 1958, quando, provindos da Ordem dos Advogados, a minha mãe e  o advogado e pintor Dr. ARLINDO VICENTE, membro do Partido Comunista Português e candidato à Presidência da República foram, de repente, abordados, na Praça dos Restauradores, por dois agentes da PIDE, que agarraram o referido causídico com o propósito de o arrastarem para dentro de um carro e desaparecerem, pela calada da noite. Como na canção de José Afonso: “era de noite e levaram”.

Tentaram-no mas não conseguiram, que a minha mãe agarrou-se, com unhas e dentes, ao colega e desatou a gritar por socorro, tendo atraído, nesse frenesim de gritos e bulha física, um polícia sinaleiro que ali estava de serviço e que, de imediato, ignorante de tudo, se aproximou em auxílio de ambos e acabou por levar toda a gente para a esquadra, forçando assim os raptores a refrearem o seus ímpetos e intenções, pois tinham de ser discretos e de não dar muito nas vistas. ARLINDO VICENTE viria a ser preso, mais tarde, no ano de 1961.

Recordo também um fim de tarde em que a minha mãe chegou, combalida, a casa, depois de ter estado em Aveiro, onde se havia realizado o III CONGRESSO DA OPOSIÇÃO DEMOCRÁTICA e onde a polícia de choque tinha investido contra os manifestantes pacíficos que circulavam nas ruas daquele cidade, vindo minha mãe a ser atingida com duas ou três bastonadas na cabeça por um dos agentes, quando, num impulso de revolta e raiva contra a violência que presenciava e que se traduzia na agressão indiscriminada e por vezes sangrenta das pessoas que a rodeavam, se voltou para os elementos da força policial que se aproximava e chamou-lhes, aos berros, “assassinos”, “assassinos”, “assassinos”.

Com as cacetadas que levou, minha mãe terá tombado ou, pelo menos, se ajoelhado no passeio,  mas, como me contava depois, não teria sido também atacada pelo pastor-alemão que era levado à arreata pelo seu agressor, dado o animal em questão ter sentido que ela gostava de animais…                        

O 25 de abril de 1974 foi, para a minha mãe – como, certamente, para muito de nós –, um dos grandes – senão mesmo o maior – acontecimento da sua vida.

Ora, nessa madrugada do dia da revolução dos cravos, após um telefonema de alerta para o que se estava a passar nas ruas e que levou a família a  refugiar-se toda, novos e velhos, na casa do irmão da minha mãe, esta, contra a opinião de todos, desarvorou para a Baixa, argumentando que tinha um julgamento marcado para as 10,00 horas da manhã – o que, efetivamente, correspondia à verdade, decorrendo o mesmo no tribunal plenário da Boa Hora e tendo, como réus, diversos elementos da ARA [AÇÃO REVOLUCIONÁRIA ARMADA], braço armado do Partido Comunista Português, na resistência ao fascismo -, audiência essa que contudo não se chegou a realizar, dado a DGS [DIREÇÃO GERAL DE SEGURANÇA, antiga PIDE] ter comunicado ao juiz do processo que não conseguia assegurar a comparência dos presos no tribunal.

O magistrado judicial que presidia aos trabalhos quis marcar uma nova data para a sua realização mas a minha mãe, segundo ela me contou, disse-lhe, empolgada, que era melhor adiá-lo «sine die», pois aquele julgamento nunca mais se faria.

Tinha ABSOLUTA razão. Não se fez nesse dia nem nos cinquenta anos de democracia que já levamos. Que venham então, não apenas mais cinco, mas mais cinquenta anos.

 

 



ASSOCIAÇÃO DO PATRIMÓNIO DE TORRES VEDRAS - 45 ANOS EM PROL DO NOSSO PATRIMÓNIO CULTURAL Jornal BADALADAS 26 ABRIL 2024

 

ASSOCIAÇÃO DO PATRIMÓNIO DE TORRES VEDRAS

45 ANOS EM PROL DO NOSSO PATRIMÓNIO CULTURAL

 

A Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras completa, em 2024, 45 anos de existência. A festa fez-se no Moinho do Paul, no passado dia 20 de Abril, com jantar de convívio – em que participou um número significativo de associados – seguido da Assembleia Geral com eleição de novos Corpos Sociais.

Os anos da pandemia e outras dificuldades de funcionamento não impediram a Associação de continuar o seu trabalho, como ficou expresso no relatório de actividades apresentado pela Direcção cessante, o qual se reporta aos anos de 2019 a 2023.

Não é possível enumerar aqui todas essas actividades – um total de 190 intervenções, bem explicitadas e datadas no Relatório. Algumas delas podem ser agrupadas: 14 visitas guiadas, com um total de cerca de 700 pessoas, a maioria de forasteiros interessados em conhecer o nosso Património; 4 acções de Formação no âmbito do projecto ISA PATRIMÓNIO, em parceria com o sector cultural da Câmara Municipal de Torres Vedras; 66 páginas PATRIMÓNIOS, publicadas mensalmente no jornal Badaladas, versando os mais diversos temas patrimoniais e da autoria de 17 colaboradores e/ou membros da Direcção; 9 palestras; 10 acções de Educação Patrimonial junto de diversas escolas; edição de 4 livros. Ao longo destes quatro anos, fizeram-se muitas reuniões com responsáveis autárquicos, para obter esclarecimentos, fazer propostas, apresentar protestos ou fazer elogios. Duas jovens investigadoras pediram a colaboração da Direcção para elaborarem trabalhos académicos. Uma delas, que entrou agora para a Direcção, fez a sua dissertação de Mestrado sobre “Educação e Património – O caso da Associação do Património de Torres Vedras”. Trabalho meritório que atesta os nossos muitos anos de trabalho e a sensibilização da juventude para as questões da salvaguarda do nosso Património.

Na leitura do relatório, ressalta a verificação de que houve intervenções da Associação em todos os meses daqueles quatro anos de actividades, o que atesta regularidade e presença constante na defesa e divulgação do nosso Património. Sublinha-se, também, que a Associação manteve actividade ininterrupta ao longo dos 45 anos da sua existência – o que não é comum na maioria das associações de património do nosso país.

Neste convívio celebratório, os presentes homenagearam os associados entretanto falecidos, alguns dos quais foram os fundadores no já longínquo ano de 1979. Uma referência especial ao P. José Manuel da Silva, sócio fundador nº 1, que nos deixou em Março passado.

Por último referiu-se que a Associação do Património faz parte do colectivo FORUM DAS ASSOCIAÇÕES, sediado na Calçada do Quebra-Costas, no qual estão representadas mais quatro associações torrienses.

 


 

                                                               O mais velho e a mais nova da Direcção

PROJECTOS PARA O FUTURO

O que foi realizado é o alicerce para o futuro que nos espera. Nessa perspectiva, a nova Direcção apresentou o seu Plano de Actividades para o próximo biénio:

·       Criação de uma newsletter mensal a enviar aos sócios

·       Continuar as atividades do Isa Património, em parceria com a Câmara Municipal

·       Manter a parceria com o Sector de Turismo da C. Municipal, realizando visitas do projecto Passos em Volta

·       Parcerias com as escolas, nomeadamente com o agrupamento de Escolas  Madeira Torres, e com outras que venham a surgir

·       Intervir, sempre que necessário ou oportuno, em reuniões com a vereação, em artigos na imprensa e nas redes sociais

·       Manter a disponibilidade para colaborar na concretização de um Centro de Interpretação da muralha de Torres Vedras

·       Organizar uma base de dados e disponibilizá-la online

·       Participar das atividades do Fórum das Associações, nomeadamente da sua direção, contribuindo para o seu funcionamento e reflexão sobre futuro associativo

·       Eleger a política museológica municipal como tema prioritário para orientar uma reflexão interna e como motivo propulsor de debate alargado à comunidade torriense

·        Acompanhar a questão da salvaguarda da Casa das Termas da Fonte Nova

·       Continuar a acompanhar o PUCTV (Plano de Urbanização da Cidade de Torres Vedras), nomeadamente nas propostas por nós apresentadas, através da apresentação fundamentada de um Plano de Salvaguarda de edificações consideradas importantes para a história da cidade, ou de espaços construídos, como o Bairro Novo

·       Seguir com interesse o desenvolvimento da Marca Torres Vedras

·       Seguir e colaborar quando solicitado com o Plano Municipal de Acção Climática

Cremos deste modo dar o nosso sincero contributo para esta causa que nos move, a preservação do Património, sem saudosismos passadistas, mas com noção da memória coletiva que é fundamental permanecer e transmitir a gerações futuras. A construção e consolidação dos valores da democracia afigura-se fundamental nos tempos atuais, pelo que também é imperativo deixarmos o nosso contributo.

O 45º aniversário que comemoramos acontece no mesmo ano em que festejamos os 50 anos do glorioso e libertador 25 de Abril. Nascemos da conquista da liberdade e esse é um futuro que queremos deixar como legado.


Nova Direcção (Falta o José Manuel Pinto Gouveia, que não poude estar presente neste dia):
Pedro Fiéis, Ana Rita Pereira, Joaquim Moedas Duarte e José Pedro Sobreiro



11 agosto 2024

VIR DOLORUM, UM QUADRO DE JOSEFA DE ÓBIDOS EXPOSTO NO MUSEU MUNICIPAL / Jornal BADALADAS - 29 MARÇO 2024

 

VIR DOLORUM

UM QUADRO DE JOSEFA DE ÓBIDOS

EXPOSTO NO MUSEU MUNICIPAL

José Pedro Sobreiro

 


Desde o dia 25 de janeiro e até 25 de junho está patente, numa sala do Museu Municipal Leonel Trindade, de Torres Vedras, uma pintura pertencente Convento do Varatojo, denominada Vir Dolorum, cuja autoria é atribuída à Oficina de Josefa de Óbidos. O interesse da apresentação desta obra reside, desde logo, na revelação desta surpreendente pintura daquela notável artista portuguesa do séc. XVII, mas também na abordagem do trabalho de restauro e no estudo interdisciplinar desenvolvido a partir do mesmo – de técnicas, materiais, contexto histórico-artístico e expositivo – com a inclusão, entre outros elementos, de um vídeo demonstrativo dos processos e das fases desse procedimento.

             

O EVENTO

A realização deste importante trabalho ficou a dever-se ao colectivo Associação TENTO, formado por Daniela Morgadinho e Milene Santos, ambas com Licenciatura e Mestrado em Conservação e Restauro, a operar no concelho de Torres Vedras e do qual já aqui se deu notícia (edição de 30 /abril /2021). Tal projecto teve o apoio da Câmara Municipal através do Regulamento Municipal de Atribuição de Apoios, o qual proporcionou a verba que permitiu a realização do trabalho de restauro da pintura e do respetivo estudo interdisciplinar.

Todo este trabalho contou com a supervisão da conservadora/restauradora Dra. Vanessa Antunes, do Prof. Vítor Serrão e do Prof. Fernando António Batista Pereira, individualidades de reconhecido prestígio nesta área da nossa história da arte, que também assinaram a curadoria da exposição, assim como dinamizaram o Congresso “Pelas Cores da Terra Mãos de Josefa | Novas Possibilidades”, anteriormente realizado, no dia 20 de janeiro, no auditório do Edifício dos Paços do Concelho. Neste congresso, organizado pela Associação TENTO, enunciaram-se novas possibilidades que a Oficina de Óbidos apresenta aos historiadores de arte e conservadores-restauradores contemporâneos, para além do enquadramento da obra de Josefa e de seu pai, Baltazar Gomes Figueira, no quadro do barroco português.

A OBRA

A denominação Vir Dolorum – literalmente, Homem das Dores – constitui um dos temas da  paixão de Cristo, representado em expressão sofrida com os atributos da flagelação – a coroa de espinhos, a corda ao pescoço e o manto vermelho – mas também da crucificação – a exibição das chagas nas mãos que se mostram de frente para o observador, destacando as feridas causadas pelos pregos na cruz. Trata-se, pois, de uma representação após a morte, ou, de um Cristo ressuscitado. Originária da arte bizantina, foi adoptada pela arte ocidental em finais da Idade Média, sendo muito divulgada em gravuras já no séc. XVI. E terá sido uma destas gravuras, originárias do centro da Europa, que terá servido de base à pintura em causa. Normalmente a figura de Jesus é apresentada inteira, mas a pintora de Óbidos optou aqui por meio corpo. O fundo negro reforça o dramatismo da figura, notável de expressão, algo estilizada de forma a acentuar a expressão de sofrimento.   Trata-se de uma obra singular e inigualável da única pintura conhecida da Oficina de Óbidos relativa à temática da emoção na dor.

A expressão em causa deriva da tradução latina da Bíblia (Vulgata) de um texto do profeta Isaías:

              «Era desprezado e rejeitado dos homens; um varão de dores, e que tinha experiência de enfermidades. Como um de quem os homens escondiam o rosto, era ele desprezado, e dele não fizemos caso. Verdadeiramente foi ele quem tomou sobre si as nossas enfermidades, e carregou com as nossas dores; e nós o reputávamos como aflito, ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, esmagado por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos devia trazer a paz, caiu sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos nós sarados. Todos nós temos andado desgarrados como ovelhas; temo-nos desviado cada um para o seu caminho; e Jeová fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós.» (Isaías 53:3–6).  Entendida como tradução visual do dogma da Transubstanciação, segundo o qual o pão e o vinho se transformam no corpo e no sangue de Cristo, no momento da consagração, a imagem do Vir Dolorum torna-se, assim, um símbolo eucarístico.

Esta tipologia devocional da representação de Cristo em sofrimento confunde-se, de algum modo, com uma outra, porventura mais conhecida na iconografia cristã, designada por Ecce Homo (“Eis o Homem”) frase proferida por Pilatos, após ter mandado flagelar Jesus, na tentativa de acalmar os ânimos inflamados da multidão que exigia a sua morte. A diferença é que nos apresenta o Cristo ainda vivo, ao passo que o Vir Dolorum nos mostra o Senhor ressuscitado.

O LOCAL 

Esta pintura da igreja do convento do Varatojo, encontrava-se, já no nosso tempo, em lugar diferente daquele para o qual foi feita. O presente processo de investigação, liderado por Fernando António Batista Pereira, situou-a no altar da segunda capela lateral à direita, conhecido actualmente por altar de Nossa Senhora das Dores. A investigação apurada com base documental permitiu datar o primitivo altar de 1680, confiado à execução da oficina de Óbidos e que incluía a presente pintura, colocada por cima do sacrário no primitivo retábulo, por estar relacionada com a eucaristia.

Mais tarde, em 1740, a capela foi renovada com outro programa iconológico (o que hoje ali pode ser visto) por sinal da uma das preciosidades artísticas da igreja do Varatojo. Tal programa manteve a temática da dor, mas agora centrada na mãe de Cristo. É um espaço totalmente preenchido com obras de arte, como é apanágio do pleno barroco, com o retábulo em talha ocupando todo o fundo da capela e onde se destaca, entre várias, a imagem central de Nossa Senhora das Dores com as sete espadas cravadas no peito. Nas paredes laterais quatro painéis de azulejo representam alguns passos dolorosos da vida de Maria, e em cima duas pinturas a óleo com temas da paixão.                                                                                                                         O quadro agora restaurado foi a única peça que restou do primeiro retábulo, estando colocado noutro sítio da igreja, onde passava despercebido. As restantes peças foram dispersadas por várias igrejas e conventos da região. Uma dessas pinturas, denominada Menino Jesus Salvador do Mundo, essa, sim, imediatamente reconhecível pelo estilo inconfundível de Josefa, está atualmente no Museu Nacional de Arte Antiga.

Com estas linhas sobre tão interessante evento queremos felicitar, desde logo, as autoras do restauro, cujo empenhado e rigoroso labor se vai já traduzindo num apreciável currículo, e também sublinhar o carácter exemplar desta iniciativa que, envolvendo várias entidades num trabalho de colaboração – as personalidades referidas e a Câmara Municipal - se afirma como testemunho de uma prática desejável na preservação e divulgação do nosso património artístico.                                   E não deixamos de assinalar que a presente mostra pode também prenunciar uma nova valência da oferta do Museu Municipal – a realização de pequenas exposições temporárias – que possam complementar a desejável retoma da exibição pública do seu espólio permanente e, assim, ajudar a dinamizar o magnífico espaço do Convento da Graça.

Referência: folheto da exposição VIR DOLORUM elaborado pelo Museu Municipal Leonel Trindade