A
revista O Ocidente que se publicava
em Lisboa, mas versava assuntos de Portugal e do estrangeiro, inseriu no seu
número de 5 de Junho de 1895, uma reportagem intitulada “Visita a Torres Vedras
– Inauguração das águas da Fonte Nova”, assinada por Caetano Alberto e
ilustrada com litografia feita a partir de uma fotografia de Martinez Pozal. A
prosa expressiva e a bela ilustração transportam-nos à época em que António dos
Santos Bernardes, proprietário da casa, convidou altas personalidades da terra
e da capital, bem como várias bandas de música, para a inauguração das suas
termas. Festa rija que incluiu almoço nas Termas dos Cucos e jantar no Hotel
Natividade. O repórter, encantado com as paisagens do Oeste e as degustações
refeiçoeiras, mais se deliciou com as moçoilas que serviam a água aos
visitantes das novas termas inauguradas naquela Quinta Feira de Ascensão, 23 de
Maio de 1895. Ele o diz: «Aquelas águas, servidas por umas empregadas tão
garridas e tão pitorescamente formosas, devem necessariamente duplicar os seus
efeitos salutares…».
Salinas
Calado, notável patrimonialista que viveu muitos anos em Torres Vedras, já aposentado,
acalmava saudades em crónicas regulares no Badaladas.
Em 16 de Junho de 1962 dava conta de um folheto que casualmente lhe viera às
mãos, intitulado “Fonte Nova (Torres Vedras) – Águas medicinais”, no qual “o
sábio analista Charles Lepierre” assegurava as qualidades medicinais daquelas
águas, indicadas para males de estômago, entre outros.
Adão
de Carvalho, que tanto amou e divulgou as antiguidades torrienses, assinalou o
centenário da inauguração das termas da Fonte Nova com um artigo no Badaladas de 19 de Maio de 1995.
Socorrendo-se dos apontamentos e recortes antigos de imprensa que
laboriosamente colecionava, lembra que as termas foram uma iniciativa do
proprietário que as mandou construir sobre a nascente daquelas águas
medicinais. Previamente analisadas, assegurou-se do seu valor – foram
comparadas às das Pedras Salgadas e Vidago. A verdade é que o povo já se
habituara a procurar nelas o alívio das más digestões e, até, do reumático. A
construção das termas respondia à procura, garantindo qualidade de manuseio e
assistência médica no seu consumo.
As
termas funcionaram cerca de cinco anos e, a seguir foram encerradas pois as
despesas eram superiores às receitas. Motivo prosaico a que se juntou o decréscimo
da qualidade da água, talvez devido à maior procura e à proximidade de um
número crescente de habitações. O proprietário morreu e o sobrinho ainda
permitiu, durante algum tempo, o usufruto gratuito das águas.
A
propriedade acabou por ser adquirida mais tarde pela família Chichorro, da
Quinta de Vale de Galegos, que a manteve praticamente até aos nossos dias.
FUTURO
Desenho tosco, apenas indicativo
De
acordo com o site da Câmara Municipal de Torres Vedras, «o procedimento de
concurso público para conceção, realização de obras de requalificação e
exploração para fins hoteleiros, termais e de restauração do edifício das
antigas “Águas Termais da Fonte Nova” insere-se no “Programa Estratégico de
Oferta Hoteleira da Cidade de Torres Vedras”».
Significa,
pois, que aquele espaço será requalificado e reactivado. O auto de vistoria,
realizado pela Divisão de Gestão Urbanística, com a colaboração da Área de
Regeneração Urbana, analisou pormenorizadamente todo o conjunto e apontou como
orientação de respeito obrigatório a manutenção da traça primitiva do edificado
e, «caso seja equacionada a possibilidade de ampliação do edifício, de modo a
viabilizar o investimento na sua reabilitação e revitalização, (…) que essa
ampliação se efetue para a Rua Capitão João Figueirôa Rego, preenchendo o
espaço do logradouro compreendido entre a fachada poente do edifício
habitacional e o prédio contíguo com o n.º 3 desta rua».
Aguardemos,
agora, a coragem e o investimento necessários ao ressurgimento da Fonte Nova.
Direcção
da
Associação para a Defesa e Divulgação
do
Património Cultural de Torres Vedras
Nota publicada na página do Facebook de Joaquim Moedas Duarte:
Complementando o que anteriormente aqui deixei escrito sobre o edifício das Termas da Fonte Nova, transcrevo a parte do Auto de Vistoria, realizado pela Divisão de Gestão Urbanística, com a colaboração da Área de Regeneração Urbana, que refere o que deve ser respeitado na futura recuperação do edifício.
Lembro que a imagem do edifício futuro é apenas desenho tosco que não passa disso.
O documento pode ser analisado pelos interessados na Câmara Municipal ou pedido por mail.
Dada a sua extensão, não é viável a sua reprodução neste espaço.
AUTO DE VISTORIA:
(...) [ Descrição pormenorizada de todo o conjunto, com enumeração das anomalias e estado das estruturas, pavimentos, paredes, tetos, etc. ]
«2. Elementos Patrimoniais a preservar nos edifícios
2.1 Edifício Habitacional
Avaliado o edifício habitacional, considerou-se que deveriam ser element
A escada interior principal do edifício que se encontra em bom estado de conservação, devendo manter-se a sua forma, guarda e revestimento dos degraus em madeira;
Os tetos trabalhados em estuque e madeira (esta pode ser substituída por madeira nova), sobretudo no piso térreo;
Os vãos das portas interiores principais dos diversos compartimentos, sobretudo, as que apresentam na parte superior do vão elementos em vidro;
Procurar aproveitar as portas interiores em madeira que estejam em bom estado;
Os pavimentos cerâmicos do piso térreo;
Na Cozinha e na instalação sanitária do piso 1, deverão ser preservados a chaminé, os elementos de azulejaria e os pavimentos cerâmicos;
Os pavimentos em madeira do piso térreo e do piso 1 e sótão deverão ser reabilitados, devendo ser substituídos por madeira nova, nos casos em que não seja possível manter os existentes;
Os rodapés em madeira do piso térreo também deverão ser reabilitados;
Ao nível do exterior do edifício deverão manter-se as fachadas principais, com a métrica dos vãos, materiais das molduras dos vãos, materiais da fachada e dos vãos (madeira) e cor da fachada (amarelo torrado).
As portas e janelas exteriores cujo material em madeira esteja em bom estado deve valorizar-se a sua recuperação em detrimento de colocação de novos vãos em madeira;
As testas dos vãos interiores e exteriores com bandeira em vidro, deverão ser repostos/reabilitados com o mesmo desenho e métrica, existentes;
A chaminé principal do edifício deverá igualmente ser mantida. Deverá manter-se o pé-direito dos pisos térreo e piso 1.
Na fachada poente existem ainda uma varanda e uma escada exterior metálica em caracol, cuja manutenção deverá ser equacionada, caso o edifício seja ampliado na Rua Capitão João Figueirôa Rego. Neste caso deverá equacionar-se a possibilidade de relocalização da escada exterior noutro local do edifício.
Considera esta comissão que poderá equacionar-se para um aproveitamento do piso de sótão, a subida do arranque da cobertura, cuja morfologia poderá ser alterada, através o aumento da cota da cumeeira.
2.2 Edifício das Termas
No edifício das termas deverá procurar-se manter a sua cércea e volumetria, assim como a imagem exterior que tinha e que consta da imagem acima.
Deverão ainda manter-se:
Os pavimentos cerâmicos e azulejos;
A escadaria de acesso à fonte termal e o compartimento com os bancos; Não foi possível visualizar a fonte termal, devido à densa vegetação
existente, mas deverá procurar-se manter este elemento, como memória do local;
Ao nível do exterior, e tal como do edifício principal deverá manter-se a imagem, métrica dos vãos e materiais associados aos vãos e fachada, assim como a sua cor;
No que diz respeito à cobertura, deverá ser encontrada uma solução que, não obstante a sua contemporaneidade, resulte de uma reinterpretação da
morfologia original, incluindo a iluminação zenital, sem comprometer a identidade do edifício.
2.3 Logradouro
O logradouro principal para a Rua Santos Bernardes deverá manter o seu estado original, assim como os muros, portão principal e gradeamento em ferro, que deverá ser preservado. Poderá admitir-se, no entanto, uma alteração do muro na zona junto ao edifício com o n.º 3 da Rua Santos Bernardes de modo a também valorizar o espaço público e acessos ao recinto, mas sempre mantendo o pórtico preexistente no respetivo local.
Caso seja equacionada a possibilidade de ampliação do edifício, de modo a viabilizar o investimento na sua reabilitação e revitalização, esta comissão aconselha que essa ampliação se efetue para a Rua Capitão João Figueirôa Rego, preenchendo o espaço do logradouro compreendido entre a fachada poente do edifício habitacional e o prédio contíguo com o n.º 3 desta rua.
Uma ampliação do edifício nesta rua permitiria também anular a empena que o n.º
3 da Rua Capitão João Figueirôa Rego gera sobre o terreno.
[ Fotos com indicações diversas]
(...)
4. Conclusão
Sugere-se que as intervenções nos edifícios e logradouro, obedeçam aos seguintes princípios:
Habitação – a intervenção deve ser mais ligeira, voltada para conservação e reabilitação, onde a quantidade de elementos originais justifica o seu reaproveitamento acompanhado pela reposição de elementos em falta: estrutura, soalho, azulejos, mosaicos, carpintarias, etc. Conseguir uma solução que garanta os princípios de autenticidade e reversibilidade do património existente. A futura intervenção não deve ser demasiado invasiva, aproveitando o máximo de compartimentos interiores, para a integridade estrutural não ficar comprometida.
Termas – exige uma reabilitação mais profunda, onde os elementos a aproveitar são em menor quantidade, não justificando recorrer a imitações.
Logradouro – ampliação/construção nova, cuja solução respeite a preexistência, mas que assuma a sua contemporaneidade