15 outubro 2012

TERMAS DOS CUCOS - A nossa próxima VISITA GUIADA




No dia 20 de Outubro, pelas 14H30, iniciaremos uma visita guiada às Termas dos Cucos, em que seremos acompanhados por um dos seus proprietários, Paulo Neiva Vieira e por Ramiro Fernandes que lá trabalha há 61 anos.

As fotos do lugar e o artigo muito interessante  publicado há 20 anos pelo semanário torriense BADALADAS servem aqui de motivação para mais esta jornada de divulgação do nosso património








Fotos (C) J. Moedas Duarte - Nov 2011

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TERMAS DOS CUCOS – HOJE COMO DANTES
J. Paulino Pereira

BADALADAS ( Semanário de Torres Vedras), 
11 / Dezembro / 1991

Há mais de dois séculos que as águas mineromedicinais dos Cucos têm sido notícia e tema de conversa.
Já em 1646, o Dr. Moniz de Carvalho, médico do partido mu­nicipal de Torres Vedras, descobria o seu valor terapêutico, muito embora a população as usasse, empiri­camente, tempos antes para alívio dos diversos males.
Desde então multiplicaram-se os estudos e as publicações médi­cas, iniciadas em 1810 pelo Dr. Francisco Tavares, da Universidade de Coimbra, até ao consagrado hidrologista, Professor Armando Narciso, de Lisboa, que sublinhou no seu último trabalho sobre as termas dos. Cucos, a sua essencial vocação para reumáticos e gotosos.
Será, todavia, em 1815, a partir da arrematação em hasta pública da Quinta da Macheia e o Sítio dos Cucos, por João Goncalves Dias Neiva, que as Termas conhecem um período de grande desenvol­vimento. Através dos tempos, esta propriedade tem-se mantido una e indivisa, transmítindo-se como um vínculo, de tios a sobrinhos e de pais a filhos. Para sua valorização realizaram-se melhoramentos das instalações balneares, protegendo-as das arremetidas do Sizandro, então pujante e despoluído no seu curso.



Durou 17anos a administração do seu primeiro concessionário, que, antes da sua morte, na Quinta da Macheia, em 20-Fev-1868, vítima de acidente vascular cerebral, fizera seu herdeiro o sobrinho, José Gon­çalves Dias Neiva, que ficaria recor­dado na toponímia torriense.
Vivia-se então uma época em que os doentes procuravam nas Termas o que a Farmacopeia não lhes dava. A falência do tratamento medicamentoso e a propaganda co­mercial gerada à volta das águas faziam destas a melhor panaceia para todos os males. Os conces­sionários, por todo o País, esforça­vam-se por dotar as suas termas de centros de tratamento e de diversão.
Nos Cucos, o seu proprietário, alicerçado numa sólida e abastada fortuna, chegou mesmo à utopia de pretender criar uma povoação com o nome de "Vila Neiva dos Cucos", com um projecto megalómano, onde se incluía, entre outras inovações, um Hotel com 300 quartos e um Hospital Termal. As obras de custo incalculável, ficaram longe do fim e terminaram numa desgastante de­manda judicial com o Engº António Jorge Freire, autor do projecto.

Apesar desta enorme contra­riedade, a inauguração faz-se, ofi­cialmente, em 15 de Maio de 1893, muito embora, já em 11 de Julho de 1892, as termas tivessem sido aber­tas ao público.
A festa da inauguração foi as­sinalada por um arraial de cariz po­pular, onde estiveram presentes as filarmónicas Torrienses e da Ermegeira. A partir de então e já com a chegada do primeiro comboio a Torres Vedras, em 30-Dez-1886, os Cucos conheceram um surto de grande progresso e desenvolvimento, chegando a sua fama a todo o País, Brasil e África.
A hipotética "Vila Neiva dos Cucos" deixou, além das 2.400 árvores trazidas dos viveiros do Buçaco, algumas construções, co­mo o Estabelecimento Termal, o "chalet" D. Feliciana, construído em 1895 e o de D. Maria, no ano se­guinte. O Casino, cujas obras se concluíram neste mesmo ano de 1896, ficou reservado para refeições e recreio. Há ainda quem recorde alguns bailes, onde estiveram pre­sentes a arte de dançar de Manuel Firmino da Silva, conhecido entre os rapazes do seu tempo pelo Ma­nuel Pazada e também a graça fácil e o bom humor de Edmundo Carnide. As realizações referidas foram aproveitadas pelo concessionário das Termas para serem profusa­mente divulgadas através da objec­tiva do Senhor Pozal, conceituado fotógrafo em Torres Vedras, que transformou as suas fotos em "ex-libris" dos Cucos.

Em 1929, José António Vieira herda a fortuna do tio e passa a gerir as termas dos Cucos. Não tem, po­rém, oportunidade de fazer grandes melhoramentos, pois, em 3 de Março de 1932, é surpreendido por um processo judicial. A acção vem de Fragoso, concelho de Barcelos e da freguesia de Alvarães, em Viana do Castelo. A sua tia, Maria do Carmo Neiva e alguns primos invocam a falsidade do testamento cerrado feito por José Gonçalves Dias Neiva, em 10-Março-1928, que aponta como único herdeiro o seu sobrinho José António Vieira. Os litigantes insurgem-se ainda contra a escritura pública, de 20-Março-1928, res­peitante à venda da Quinta da Ma­cheia e ainda contra segundo tes­tamento cerrado, de 20-Abril-1928. Tanto a escritura pública, como os dois testamentos contemplam o sobrinho José António Vieira. Os reclamantes afirmam que o tio José Gonçalves Dias Neiva tinha sido acometido por um acidente vascular cerebral em 4 de Novembro de 1925. Após este acidente apoplético, ha­via ficado com uma hemiplegia à direita que impedia de escrever e de raciocinar. Tinha então ultrapassado a idade de 80 anos. Em 17 de Março de 1928, surgiu um novo acidente vascular, que, segundo eles, forçou o doente a uma vida vegetativa e a uma dependência absoluta.
É curioso notar que à volta da situação clínica do doente se pro­nunciaram os mais famosos Mestres da Medicina portuguesa. Tudo se resumia a esclarecer se a hemiplegia era à direita ou à esquerda. Votaram os Professores pela lesão do hemisfério cerebral direito, que determinou a hemiplegia esquerda, contrariando a tese dos reclaman­tes, que afirmaram ser a hemiplegia à direita.

Começou então um pleito ju­dicial longo, em que se digladiaram os Advogados Joaquim Gualberto de Sá Carneiro, do Porto e José Gonçalves Dias, de Torres Vedras e em que figuraram, como testemu­nhas de defesa de José António Vieira, prestigiados nomes da Igreja e da Medicina, entre outros, D. José Alves Correia da Silva, Bispo de Leiria, Dr. Galamba de Oliveira, Professor do Seminário de Leiria e Professor Doutor Francisco Pulido Valente, Catedrático da Faculdade de Medicina de Lisboa.
Até os familiares desavindos chegarem a um acordo, José An­tónio Vieira gastou uma boa parte da sua fortuna, numa acção que rondou os dois mil contos. Foi, na­turalmente, obrigado a fazer uma pausa na modernização dos Cucos. Para que os prejuízos se atenuas­sem instalou ali um Colégio, no ano de 1932, que funcionou fora dos quatro meses de actividades das Termas. Foi um fracasso e não vol­tou a repetir-se.

Com a morte deste proprietário, em 7-Agosto-1962, após 33 anos de actividade, sucede o seu filho Dr. José António Neiva Vieira, na ges­tão e Direcção Clinica.
É a altura em que os corticosteroides, prescritos para atenua­rem as dores da artrite reumatóide e debelarem os edemas, tomam grande incremento. Os doentes afastam-se dos Cucos, mas irão voltar, pois a Medicina, sempre que possível, prefere os banhos aos medica­mentos daquele tipo, que não são inócuos.
O Dr. José António Neiva Vieira foi um dos mais brilhantes hidrologistas do nosso País, mas não con­seguiu avançar com um projecto de remodelação para as Termas, que não tém, nitidamente, acompanhado os legítimos interesses de quem as procura. Faleceu, vítima de brutal acidente, em 1987, após 25 anos de exercício médico naquele estabele­cimento termal.

Mantendo-se a estagnação de décadas, corre-se o risco de vermos as Termas transformadas em mu­seu, guardando um espólio histó­rico notável. Lá se encontrariam as memórias dos três grandes pleitos judiciais, o primeiro dos quais data de 1782 e durou 48 anos, por ter atravessado um longo período revolucionário no País. Poderíamos ainda manusear os estudos médicos do Dr. Justino Xavier da Silva Freire, seu primeiro Director Clínico, que até 1925, exaltou o valor das águas e lamas naturais, comparativamente com Baden-Baden e Niederbronn. Figurariam também os não menos valiosos trabalhos do Dr. Boaventura Dias Sarreira, seu segundo Director Clinico, durante 32 anos, sobre a "Royai Portuguesa", ao informar a acção das águas sobre a hiperten­são arterial.

Se folheássemos o registo dos doentes desde 1893, encontraríamos nomes ilustres como o do antigo Presidente da República, Dr. An­tónio José de Almeida e o do Prof. Doutor Egas Moniz, antigo Prémio Nobel da Medicina.
O Turismo, desde 1989, investiu nas Termas do País 4 milhões de contos, numa aposta forte no termalismo de qualidade. Este ano, três Termas construíram novas unidades hoteleiras.
Havendo, actualmente, em Portugal, cerca de 1 milhão de reu­máticos que custam ao erário público 100 milhões de contos por ano, por­que se espera para modernizar os Cucos?


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