Em 6 de Abril de 2012
TENTATIVA E
ABANDONO DO CENTRO HISTÓRICO
J. P.
Sobreiro
Quando a Associação do Património foi fundada, em
1979, o centro histórico de Torres Vedras apresentava já alguns sinais claros
de descaracterização comprometedores do seu equilíbrio urbanístico. Por isso
nele se centrou a prioridade da sua acção.
Adivinhava-se na vila, então promovida a cidade, um
natural desejo de afirmação da modernidade que a nova era democrática
inspirava, desígnio esse de que o crescimento urbano seria uma inevitável
expressão.
Perante alguma impreparação dos novos autarcas e a
inexistência de um quadro de protecção legal específico temia-se que a
desqualificação avançasse pela zona histórica entregue aos apetites dos
interesses imobiliários.
Foi assim que a ADDPCTV iniciou uma campanha de
sensibilização visando alertar público e decisores para o valor histórico e
patrimonial da zona antiga. Com efeito, em 1985 a Associação apresentou
um documento base que viria a despoletar, alguns anos depois, a elaboração do
Plano de Salvaguarda e Reabilitação do Centro Histórico de Torres Vedras,
constituindo-se para o efeito um Gabinete Técnico Local.
Pertencendo à primeira fase da implementação deste
tipo de planeamento (apenas Porto e Beja o possuíam), as dificuldades foram
surgindo e algumas divergências ocorrendo.
Foi efectuado um levantamento exaustivo de todo o
espaço público e dos edifícios, procedendo-se a uma classificação quanto ao seu
valor histórico e arquitectónico e ao seu estado de conservação.
No plano das intervenções camarárias registou-se o
calcetamento das ruas de comércio e o arranjo (não isento de polémica) dos
Largos de S. Pedro, de Santiago e de S.to António.
Tratou-se, é certo, de um plano eminentemente
arquitectónico, com pouca relevância no domínio do social. Mas lembramos que a
situação era muito diferente da actual, sentindo-se ainda alguma vida nas suas artérias. Na nossa
perspectiva, faltou a implementação de medidas efectivas de ajuda à
requalificação – os instrumentos legais existentes não funcionaram – sobretudo
na zona socialmente mais carenciada, o bairro do castelo.
Também se disse que o Plano era muito restritivo, o
que por vezes inviabilizava o desejo de requalificar… mesmo assim assistiu-se à
invasão dos alumínios e à demolição de um imóvel de qualidade.
Mas se esta fase não registou grande intervenção
nos edifícios privados, também não comprometeu grandemente a identidade do
espaço. Ficou, quanto a nós, a macular este primeiro plano a construção de dois
prédios de habitação colectiva na rua da Horta Nova, completamente fora de
escala e totalmente desinspirados.
De qualquer modo é justo referir o enorme
contributo do plano na caracterização do edificado, na distinção das diferentes
zonas e consequente definição de regras de intervenção.
Em suma, este primeiro plano colocou o Centro Histórico no mapa.
vvv vvv
Entretanto a cidade parecia ter redescoberto o
valor simbólico do Centro Histórico mas foi incapaz de suster o seu abandono e
degradação face aos desafios que uma nova lógica económica impunha.
Primeiro foram as classes mais abastadas que
abandonaram as suas moradias na procura de maior conforto e sinais de
modernidade. Depois seguiram-se as instituições administrativas e económicas
(autarquias, bancos, etc.) que desandaram em busca de novas centralidades, de
maior exposição pública e de maior operacionalidade.
Restaram algumas franjas sociais, de menores
recursos, algumas actividades artesanais em fase de extinção e o comércio dito tradicional. Neste parecia residir a
última forma de manter viva aquela zona, assegurando algum movimento diurno nas
ruas comerciais, que foram ficando desabitadas, cedendo os seus pisos sobrados
a armazéns, deixando a noite sem vida, que os raros cafés, restaurantes e bares
não conseguiam animar.
Mas até esta terciarização
– já de si sinal de uma amputação da vida social urbana – parece, hoje, incapaz
de competir com a feroz e desumana concorrência das novas formas de
comercialização: as grandes superfícies e as lojas chinesas.
É neste quadro de uma economia (demasiado) aberta
que temos de enquadrar (e aceitar?) a perda de vitalidade dos centros
históricos.
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