MURALHA DE TORRES VEDRAS
Como salvaguardar os seus vestígios?
...
Joaquim Moedas
Duarte
O BADALADAS de 10 de Setembro deste ano, publicou a seguinte nota: «Uma atenta e sensível leitora ligou-nos para que pedíssemos à Câmara, ao Museu ou à Associação do Património para olharem com outros olhos e cuidarem do que resta de uma das antigas muralhas da vetusta Turres Veteras, a qual está hoje numa montra de vidro sujo e com ervas daninhas quase da sua altura. O pedido está formulado!»
Respondemos a este pedido com todo o gosto. É que nós, Associação do Património, há muito que estamos preocupados com esta questão. Sucintamente, recordemos alguns factos.
No início de 1997, aquando da
iminente demolição do stand de automóveis do Sr. Adelino Sousa, situado frente
ao Chafariz dos Canos, a Associação do Património solicitou “à Câmara
Municipal, com a maior urgência, a realização de uma curta intervenção de
pesquisa arqueológica, em articulação com o Museu Municipal Leonel Trindade, no
sentido de averiguar eventuais vestígios da antiga muralha da vila que, segundo
documentação antiga, por ali passaria e da qual não se conheciam, à data,
quaisquer testemunhos”. Esta iniciativa foi reforçada por um artigo no
Badaladas, em 18 de Abril daquele ano, da autoria de Manuel Clemente - actual
Patriarca de Lisboa e sócio, desde sempre, da Associação – no qual se faziam
sugestões e recomendações pertinentes sobre a “necessidade de conservar e
valorizar este importante e excepcional património”.
Dada a proximidade de um monumento
nacional – o Chafariz dos Canos – os trâmites legais de autorização e definição
de condicionantes para a realização da obra demorou algum tempo, mas acabou por
iniciar-se, com a intervenção simultânea de uma equipa de arqueólogos e
técnicos do Museu Municipal, que procederam às sondagens, investigação local e
recolha de informações. Os trabalhos arqueológicos foram concluídos em Junho de
2001 e, das várias conclusões e informações a que chegaram, destacamos a
confirmação da “existência da muralha tardo-medieval – sobre cuja efectiva
construção existiam ainda muitas dúvidas – e da sua porta situada na antiga Rua
da Corredoura, atestada pela confluência da estrutura com a rua. A porta
situar-se-ia a meio da rua e dela já dificilmente restarão quaisquer vestígios”.
O relatório dos trabalhos arqueológicos sublinhava que “a partir do momento em
que se verificou a imponência e monumentalidade da estrutura descoberta e se
percebeu o seu valor histórico, a direcção científica dos trabalhos chamou ao
processo a Divisão de Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Torres Vedras e
o então IPPAR, a fim de se estudar a possibilidade de integrar a estrutura na
nova construção, quer salvaguardando-a integralmente, quer mantendo a sua
memória no futuro imóvel, de forma adequada”.
Em reuniões posteriores, entre os
promotores da obra, a Câmara Municipal e representantes do IPPAR (Instituto
Português do Património Arquitectónico), ficou decidido salvaguardar o troço da
muralha medieval que fora descoberto.
O processo parecia bem encaminhado,
mas o facto de a loja com os vestígios da muralha ser propriedade privada e o
proprietário exigir, naturalmente, ser ressarcido, mas apresentando valores
incomportáveis, levou a um impasse sobre a necessária intervenção valorizadora
daquele património histórico. E os anos foram passando. Inconformada com a
situação, a Associação do Património de Torres Vedras contactou a Junta de
Freguesia de S. Pedro e Santiago, bem como os serviços camarários e, em 20 de
Julho de 2011, apresentou um Memorando no qual se disponibilizava para
colaborar numa solução que dignificasse aquele espaço. Tal iniciativa ia ao
encontro das preocupações da Junta de Freguesia que, correndo o risco de abuso
indevido – como chegou a ser acusada pelo proprietário – procedia regularmente à
limpeza daquele espaço. Esse Memorando foi também publicado no blogue desta
Associação (ver:
https://patrimoniodetorresvedras.blogspot.com/2011/07/o-que-resta-da-velha-muralha.html
)
IDEIAS PARA UM CENTRO
INTERPRETATIVO DA CORREDOURA (CIC)
Resumidamente, a proposta que
apresentámos e que continuamos a defender, tem como objectivo a valorização do
único vestígio da muralha medieval da Vila de Torres Vedras, posto a descoberto
em 2001, que se encontra situado na cave de um edifício em frente do Chafariz
dos Canos. Este pequeno troço de muralha situa-se nas imediações do que seria a
chamada Porta da Corredoura, Sendo difícil conciliar a sua presença e
visibilidade com outras funções, designadamente comerciais, a Associação para a
Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras (ADDPCTV) propõe a
criação naquele espaço de um pequeno centro interpretativo da Muralha Medieval
assim como do Chafariz dos Canos, existente naquele largo, recentemente
restaurado. Criar-se- á, assim, um motivo de interesse pedagógico para a
história da cidade que valorizará também o monumento mais singular de Torres
Vedras.
A proposta, ainda em esboço,
assenta na ideia da construção de uma plataforma parcial ao nível do piso
térreo, em L, que permita o acesso público (condicionado) a um espaço
expositivo onde através de painéis infográficos, fotografias e maquete
tridimensional, se dê a conhecer a história e as características do monumento e
da muralha/vila medieval. Sobre a abertura ao público, a ideia é, pelo menos da
nossa parte, que esta seja condicionada a visitas previamente solicitadas
(escolas, grupos, visitantes especiais,etc), assumindo esta associação o
compromisso de assegurar o seu acompanhamento.
Considera-se que a sua abertura
diária não se justificará, pelos encargos decorrentes. Mesmo assim, cremos que
a proposta terá um efeito positivo em termos de informação pois que todo o
dispositivo ficará visível do exterior (tal com agora, de resto)
A ADDPCTV disponibiliza-se para
assegurar os conteúdos históricos do Centro Interpretativo, bem como para
ministrar Formação e dar apoio ao seu funcionamento.
Do documento, então apresentado, fazia parte um esboço de intervenção, ao
qual se juntaria outro, algum tempo depois, ambos da autoria de José Pedro
Sobreiro.
(A Porta da Corredoura, hipótese interpretativa em desenho de José Pedro Sobreiro)
UM DOCUMENTO NOTÁVEL
Trata-se de um documento notável. Ali estão bem patentes as fases de
uma campanha arqueológica, a metodologia seguida, a contextualização histórica,
a enumeração exaustiva dos elementos recolhidos com as correspondentes imagens,
bem como as conclusões e recomendações para aplicação futura.
Dos mesmos autores está também disponível outro
texto que completa as informações do primeiro sobre a vila medieval, que
consultámos na mesma data:
“A urbe de Torres Vedras e a sua cerca medieva” in:
Fortificações e Território na Península Ibérica e no Magreb (Séculos VI a XVI)
- Volume I, Coord. - Isabel Cristina Ferreira Fernandes, Edições
Colibri/Campo Arqueológico de Mértola. Disponível in:
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