PÁGINA "PATRIMÓNIOS" NO JORNAL "BADALADAS" | 30 OUTUBRO 2020
IGREJA
DA MISERICÓRDIA DE TORRES VEDRAS
PROPOSTA DE CLASSIFICAÇÃO
No passado dia 26 de Julho comemoraram-se
os 500 anos de assinatura, pelo rei D. Manuel I, do alvará que criou a Santa
Casa da Misericórdia de Torres Vedras. No ano de 1520.
Sendo uma instituição de inspiração
religiosa, mas administrada por laicos, esteve sempre ligada a outras
instituições da Igreja Católica de Torres Vedras como sejam o Convento de Nossa
Senhora dos Anjos, do Barro ou as paróquias da sede do concelho.
A sua sede inicial foi o antigo
hospital e capela do Espírito Santo, pertencentes à Confraria do mesmo nome,
localizado junto à porta da muralha de Sant’Ana. Apesar das alterações
ocorridas ao longo dos séculos – de que a mais significativa foi a demolição da
muralha e daquela porta - a Misericórdia
de Torres Vedras ali tem permanecido até aos nossos dias.
Nos finais do século XVII, perante a
ameaça de ruína da primitiva capela, foi decidido construir uma nova igreja,
cuja primeira pedra foi lançada em 1 de Março de 1681. Em 1710 a primeira fase
da obra estava concluída e a bênção da nova igreja teve lugar em 6 de Setembro
daquele ano. As obras de beneficiação e apetrechamento continuaram ao longo
desse século, caso da sacristia, concluída em 1752. O terramoto de 1755 causou
estragos, pelo que foram necessárias diversas obras de restauro. Ao longo dos
séculos XVIII e XIX, obras de manutenção garantiram a perenidade deste espaço
de culto. Já nos finais do século XX, as mais recentes e importantes obras,
tanto no exterior como no interior, restituíram brilho e magnificência a todo o
edifício, no qual se integra “um dos templos de maior interesse em todo o
concelho”, no dizer dos autores do volume IV dos “Monumentos e Edifícios
Notáveis do Distrito de Lisboa”.
Tendo em conta a antiguidade e valia
deste templo, parece estranho que nunca tenha sido classificado. Sendo a classificação uma forma
de protecção de um bem cultural (Artº 16º da Lei de Bases do Património – Lei
nº 107 / 2001, de 8 de Setembro), talvez que a pertença da Igreja da
Misericórdia a uma instituição consolidada e estável ao longo de muitos séculos
explique que a sociedade torriense não tenha sentido a necessidade de
socorrer-se daquele instrumento legal para a sua preservação. Igualmente, o
facto de a Igreja se situar no perímetro urbano designado como Centro Histórico
parece garantia suficiente de protecção do edifício e da sua envolvente.
Os tempos que vivemos aconselham,
porém, uma reconsideração das condicionantes que envolvem o edifício. As
vivências cultuais de hoje são bem diversas dos tempos primitivos da
Misericórdia: já não há doentes do hospital que ali assistam aos ofícios
religiosos e as paróquias da cidade têm as suas próprias igrejas, embora na
Misericórdia se continuem a realizar actos de culto em situações festivas. Por
outro lado, o turismo cultural ganhou uma dimensão impensável há décadas atrás,
pelo que a classificação dos monumentos deixou de ter apenas o valor de
protecção legal, para se assumir como garantia de interesse turístico e de atractivo
para a sua divulgação.
CONDIÇÕES NECESSÁRIAS
Terá a Igreja da Misericórdia de Torres
Vedras características que permitam considerá-la dentro de algum ou alguns dos
critérios genéricos de apreciação para uma possível classificação, enumerados
no Artigo 17º da referida Lei? Parece-nos que sim. Desde logo, o seu carácter
matricial, espaço criado como apoio religioso da Misericórdia e assim se tendo
mantido ao longo destes 500 anos; e também o interesse do bem como testemunho
simbólico ou religioso e como testemunho notável de vivências ou factos
históricos; o seu valor estético, técnico e material, bem como a concepção
arquitectónica e urbanística, perfeitamente integrada no tecido urbano do
centro histórico; por último, a marca indelével na memória colectiva como
espaço que sempre fez parte das vivências quotidianas da população torriense.
Foi com base nestes pressupostos que a
Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras
considerou oportuno que se iniciasse o processo de classificação da Igreja da
Misericórdia de Torres Vedras, disso dando conhecimento à Mesa Administrativa
daquela instituição.
Diz o Artigo 25º da Lei de Bases do
Património que “o impulso para a abertura de um procedimento administrativo de
classificação ou inventariação pode provir de qualquer pessoa ou organismo,
público ou privado, nacional ou estrangeiro”. Assim sendo, e tendo em conta os
objectivos e a prática da Associação do Património de Torres Vedras, esta
associação tomou a iniciativa de requerer a classificação da Igreja da
Misericórdia, de acordo com o enquadramento legal definido pelo Decreto-Lei nº
309/2009, de 23 de Outubro.
O processo tem uma fase inicial que
consiste no preenchimento de um formulário constante do site da Direcção Geral do Património Cultural. É nesse
preenchimento que se está a trabalhar, de modo a facultar aos decisores os
elementos necessários para a abertura do processo de classificação. Após a
entrega do formulário, os trâmites administrativos subsequentes serão demorados,
nunca menos de dois anos. Para já, o processo vai ser iniciado.
Direcção
da ADDPCTV
O contraste entre a fachada austera
e a exuberância artística do interior – talha dourada, azulejos, pintura e
escultura – é característico do chamado “estilo chão” do Barroco português. Mais
importante do que a aparência externa é a beleza do que está la dentro – parece
ser essa, a mensagem dos construtores, clara alegoria à dualidade corpo/alma.
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