03 janeiro 2021

IGREJA DA MISERICÓRDIA DE TORRES VEDRAS

 PÁGINA "PATRIMÓNIOS" NO JORNAL "BADALADAS" | 30 OUTUBRO 2020 


IGREJA DA MISERICÓRDIA DE TORRES VEDRAS


PROPOSTA DE CLASSIFICAÇÃO

No passado dia 26 de Julho comemoraram-se os 500 anos de assinatura, pelo rei D. Manuel I, do alvará que criou a Santa Casa da Misericórdia de Torres Vedras. No ano de 1520.

Sendo uma instituição de inspiração religiosa, mas administrada por laicos, esteve sempre ligada a outras instituições da Igreja Católica de Torres Vedras como sejam o Convento de Nossa Senhora dos Anjos, do Barro ou as paróquias da sede do concelho.

A sua sede inicial foi o antigo hospital e capela do Espírito Santo, pertencentes à Confraria do mesmo nome, localizado junto à porta da muralha de Sant’Ana. Apesar das alterações ocorridas ao longo dos séculos – de que a mais significativa foi a demolição da muralha e daquela porta -  a Misericórdia de Torres Vedras ali tem permanecido até aos nossos dias.

Nos finais do século XVII, perante a ameaça de ruína da primitiva capela, foi decidido construir uma nova igreja, cuja primeira pedra foi lançada em 1 de Março de 1681. Em 1710 a primeira fase da obra estava concluída e a bênção da nova igreja teve lugar em 6 de Setembro daquele ano. As obras de beneficiação e apetrechamento continuaram ao longo desse século, caso da sacristia, concluída em 1752. O terramoto de 1755 causou estragos, pelo que foram necessárias diversas obras de restauro. Ao longo dos séculos XVIII e XIX, obras de manutenção garantiram a perenidade deste espaço de culto. Já nos finais do século XX, as mais recentes e importantes obras, tanto no exterior como no interior, restituíram brilho e magnificência a todo o edifício, no qual se integra “um dos templos de maior interesse em todo o concelho”, no dizer dos autores do volume IV dos “Monumentos e Edifícios Notáveis do Distrito de Lisboa”.

Tendo em conta a antiguidade e valia deste templo, parece estranho que nunca tenha sido  classificado. Sendo a classificação uma forma de protecção de um bem cultural (Artº 16º da Lei de Bases do Património – Lei nº 107 / 2001, de 8 de Setembro), talvez que a pertença da Igreja da Misericórdia a uma instituição consolidada e estável ao longo de muitos séculos explique que a sociedade torriense não tenha sentido a necessidade de socorrer-se daquele instrumento legal para a sua preservação. Igualmente, o facto de a Igreja se situar no perímetro urbano designado como Centro Histórico parece garantia suficiente de protecção do edifício e da sua envolvente.

Os tempos que vivemos aconselham, porém, uma reconsideração das condicionantes que envolvem o edifício. As vivências cultuais de hoje são bem diversas dos tempos primitivos da Misericórdia: já não há doentes do hospital que ali assistam aos ofícios religiosos e as paróquias da cidade têm as suas próprias igrejas, embora na Misericórdia se continuem a realizar actos de culto em situações festivas. Por outro lado, o turismo cultural ganhou uma dimensão impensável há décadas atrás, pelo que a classificação dos monumentos deixou de ter apenas o valor de protecção legal, para se assumir como garantia de interesse turístico e de atractivo para a sua divulgação.

 

CONDIÇÕES NECESSÁRIAS

Terá a Igreja da Misericórdia de Torres Vedras características que permitam considerá-la dentro de algum ou alguns dos critérios genéricos de apreciação para uma possível classificação, enumerados no Artigo 17º da referida Lei? Parece-nos que sim. Desde logo, o seu carácter matricial, espaço criado como apoio religioso da Misericórdia e assim se tendo mantido ao longo destes 500 anos; e também o interesse do bem como testemunho simbólico ou religioso e como testemunho notável de vivências ou factos históricos; o seu valor estético, técnico e material, bem como a concepção arquitectónica e urbanística, perfeitamente integrada no tecido urbano do centro histórico; por último, a marca indelével na memória colectiva como espaço que sempre fez parte das vivências quotidianas da população torriense.

Foi com base nestes pressupostos que a Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras considerou oportuno que se iniciasse o processo de classificação da Igreja da Misericórdia de Torres Vedras, disso dando conhecimento à Mesa Administrativa daquela instituição.

Diz o Artigo 25º da Lei de Bases do Património que “o impulso para a abertura de um procedimento administrativo de classificação ou inventariação pode provir de qualquer pessoa ou organismo, público ou privado, nacional ou estrangeiro”. Assim sendo, e tendo em conta os objectivos e a prática da Associação do Património de Torres Vedras, esta associação tomou a iniciativa de requerer a classificação da Igreja da Misericórdia, de acordo com o enquadramento legal definido pelo Decreto-Lei nº 309/2009, de 23 de Outubro.

O processo tem uma fase inicial que consiste no preenchimento de um formulário constante do site da Direcção Geral do Património Cultural. É nesse preenchimento que se está a trabalhar, de modo a facultar aos decisores os elementos necessários para a abertura do processo de classificação. Após a entrega do formulário, os trâmites administrativos subsequentes serão demorados, nunca menos de dois anos. Para já, o processo vai ser iniciado.

Direcção da ADDPCTV





O contraste entre a fachada austera e a exuberância artística do interior – talha dourada, azulejos, pintura e escultura – é característico do chamado “estilo chão” do Barroco português. Mais importante do que a aparência externa é a beleza do que está la dentro – parece ser essa, a mensagem dos construtores, clara alegoria à dualidade corpo/alma.


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