Publicado no BADALADAS em 30 dezembro 2011
RESSUSCITAR O CENTRO HISTÓRICO
André Tavares, Arquitecto
Face aos tempos difíceis em que vivemos torna-se cada vez mais urgente pensar sobre a recuperação dos Centros Históricos e o papel da arquitectura nesse contexto.
Mesmo antes de nos confrontarmos com a crise que assola o país e a Europa em geral, já o mercado habitacional sofria de graves problemas, nomeadamente o excesso de imóveis construídos comparativamente à dimensão da população nacional, o que contribuiu grandemente para o progressivo crescimento das periferias pouco estruturadas do ponto de vista urbano e arquitectónico.
Parece-me assim óbvio, já há bastante tempo, que é necessária uma nova abordagem à recuperação dos Centros Históricos das cidades portuguesas. Porquê criar uma série de pequenas «cidades bolsa», subúrbios que servem apenas de dormitórios, ficando dependentes do comércio e serviços prestados nos centros urbanos? Porquê, como acontece mais particularmente em Torres Vedras, insistir nas urbanizações e loteamentos isolados sem qualquer noção de planeamento urbano ou infraestruturas, para além de um pequeno e triste espaço verde e muito alcatrão? Porquê, quando uma grande parte dos edifícios antigos dos centros das cidades se encontram em péssimo estado de conservação, abandonados ou devolutos?
Este é um tema já amplamente discutido, mas aparentemente com muito poucas conclusões retiradas. É no entanto necessário revisitá-lo de maneira a que de uma vez por todas suscite dinâmicas suficientemente fortes para mobilizar todos os agentes envolvidos.
É absolutamente necessário injectar nova vida nos Centros Históricos. É necessário recuperar, classificar e preservar o que merece ser preservado, é necessário adaptar, modernizar e melhorar de acordo com os padrões actuais de qualidade e conforto, é necessário construir um diálogo coerente entre o passado e a arquitectura contemporânea e é principalmente necessário ter coragem e bom senso suficientes para demolir e substituir o que já não tem utilidade ou interesse.
Nos três textos que me convidaram a escrever para esta coluna, sendo este uma espécie de nota introdutória, tentarei aprofundar cada um destes temas, deixando o leitor desde já com uma ideia. São muito poucos os produtos que se vendem a si próprios, sendo por vezes necessário encarar estas estratégias como isso mesmo, uma venda.
Não podemos pensar que é apenas a falar sobre o assunto repetidamente, ou implementando medidas obscuras, mal estruturadas e pouco publicitadas que vamos atrair nova população ao Centro Histórico. Não é só apostando no charme romântico atribuído a estes espaços, nem na ínfima parte da população que aprecia este tipo de vivência. Como em qualquer actividade, é preciso conhecer o cliente, aprender com ele, saber o que pensa e o que deseja, interpretar o que realmente necessita e finalmente motivá-lo a alcançar o seu objectivo.
Parece-me que antes de mais será necessário criar uma boa política de incentivos. Mais do que exigir ao Estado e aos Municípios que paguem ou subsidiem as condições necessárias, temos sim de exigir a estes organismos uma política de incentivos bem estruturada, que ofereça benefícios e condições que permitam aos investidores privados apostarem na recuperação, que amplie perspectivas e saiba demonstrar e reforçar as vantagens de investir e habitar no centro histórico, e sucessivamente saber estender e publicitar esses conceitos às famílias jovens.
Com as devidas condições estas iniciativas poderiam não só dar um novo fôlego aos centros históricos, como também ao comércio tradicional e às actividades lúdicas e culturais no espaço urbano, abrindo as portas a uma nova geração que, se a oportunidade lhe fosse devidamente apresentada, viveria o centro